Entrevista com Izabela Brochado- Parte II
Entrevistadores:
Sabemos que o teatro de bonecos nordestino é bastante híbrido, apresenta diversas temáticas, manifestações e interações diferenciadas com o público. Além disso, quais foram os principais motivos para dar início ao processo de tombamento?
Izabela:
O pedido de Registro do Teatro de Bonecos Popular do Nordeste foi solicitado pela ABTB (Associação Brasileira de Teatro de Bonecos - Centro UNIMA - Brasil), em 2004, que respondeu ao alerta de pesquisadores, professores e artistas do teatro de bonecos, que destacaram a urgência de ações de Registro, inventário e salvaguarda desta manifestação da cultura popular brasileira que, a partir da década de 80 do século passado, vem sofrendo forte declínio em suas formas tradicionais de produção e circulação. Com o tombamento, espera-se que políticas públicas sejam desenvolvidas para fortalecer este patrimônio imaterial da nossa cultura.
Entrevistadores:
O processo de tombamento envolveu diversos departamentos de arquitetura a antropologia, como foi reunir todos esses e lutar por uma causa comum, sendo o teatro de bonecos algo milenar e tão atual ao mesmo tempo ?
Izabela:
A formação das equipes de pesquisa – coordenadores e pesquisadores – foi baseada em critérios de formação acadêmica, conhecimento sobre o Bem (o teatro de bonecos popular) e experiência anterior em pesquisa. Buscou-se a formação de equipes multidisciplinares, compostas por historiadores/antropólogos, por pesquisadores do teatro de bonecos e por bonequeiros, visando uma articulação entre os vários campos de conhecimento, de forma a compreender o teatro de bonecos popular em sua amplitude e propor políticas de salvaguarda do Bem.
Entrevistadores:
Agora com essa proteção institucional, quais foram as principais mudanças para os praticantes dessa forma de representação teatral ?
Izabela:
As mudanças são lentas e processuais, ainda mais considerando este golpe que o Brasil sofreu e a consequente instituição de um governo francamente displicente no que tange a cultura e a outros aspectos que fogem ao interesse do grande capital.
Até o momento, o que foi realizado foi o Edital de premiação lançado pelo IPHAN, que concedeu 37 prêmios para bonequeiros e bonequeiras e oito prêmios in memoriam. A pedido dos próprios bonequeiros, o Edital priorizou a premiação de mestres idosos com longa dedicação ao teatro de bonecos.
No entanto, espera-se que com o tombamento, outras ações venham a se concretizar no sentido de valorizar o teatro de bonecos popular e seus artistas.
Entrevistadores:
Devido a intensa participação do público no espetáculo Mamulengo, sabemos que automaticamente ocorre a quebra da quarta parede. A não interação do público com a personagem ou a dificuldade do ator em estabelecer essa relação pode gerar conflitos?
Izabela:
Conflitos eu não diria, mas um esfriamento e uma quebra do ritmo do espetáculo, uma vez que este é construído a partir desta relação, desta interação e sem ela, o espetáculo poderá ficar “frouxo”, sem ritmo.
Entrevistadores:
Qual a principal característica que diferencia o Mamulengo rural do Mamulengo urbano?
Izabela:
Há que se ter cuidado com esta distinção, uma vez que ela não é inerente. O que há são contextos diferenciados. Pode-se apresentar em uma escola seja no meio rural ou urbano; assim como, em feiras montadas nas cidades ou no campo. O que distingue é o tipo de público e o tempo disponível que o bonequeiro tem para apresentar-se. Em contextos escolares, por exemplo, o público é jovem e em geral, o espetáculo deve durar até 01 hora. Nas feiras; em bares; etc., o tempo não é fixo e em geral, varia de acordo com a aceitação do público. Eu pude presenciar espetáculos que chegaram a durar 05 horas, alguns em sítios (rural), outros, na rua em frente à bares (urbano).
Entrevistadores:
Devido ao Mamulengo relatar dores e alegrias das classes média e baixa da sociedade, e com o público afirmar situações vividas e expor suas opiniões de forma cômica.
Podemos relacionar o Mamulengo a uma forma de terapia e denúncia da realidade social?
Izabela:
Ele pode também ser isto (terapia e denúncia) a depender de quem o faz e como o faz, mas nunca poderá ser fixado dentro destas categorias, pois apresenta vários outros aspectos e características.
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